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[RESENHA] A FORMA DA ÁGUA


Olá Leitores!

Páginas: 352 | Autores: Guillermo del Toro e Daniel Kraus | Editora: Instrínseca | Ano: 2018 | Gênero: Romance, Ficção, Horror.

O filme de A Forma da Água me conquistou totalmente quando o assisti. É notável a inspiração no clássico filme O Monstro da Lagoa Negra, principalmente quando vemos o Homem-Anfíbio. Por ter gostado tanto do filme ganhador do Oscar de melhor-filme, fiquei bem ansiosa pela leitura do livro assim que o vi nas prateleiras e quando tive a obra em mãos, corri para ler e aí, bem no começo eu empaquei.

"As cicatrizes do pescoço são um mapa, não são? Lugares que seria melhor que não recordasse."


A primeira parte do livro é incrivelmente parada. Toda a narrativa é feita de forma melancólica, arrastada e isso, para quem não tem muita paciência ou costume para tal tipo de leitura, isso pode ser um empecilho. A parte positiva é que vemos aqui coisas das quais a obra cinematográfica não nos mostra. A expedição na Amazônia para a captura da criatura e os pensamentos doentios de Strickland, o vilão, e todo o seu trauma da guerra e o medo frequente de seu superior, a forma como desconta isso em casa e na sua família. Essas partes da narrativas, em minha opinião, foram feitas de forma impecável. Desde o primeiro momento, Strickland demonstrou em cada palavra e atitude a sua maldade e necessidade de ser mal com o próximo a fim de se sentir superior, visto que tinha uma relação de extrema inferioridade e sensação de impotência quando seu chefe era apenas mencionado.

"As criaturas mais inteligentes - diz ele com delicadeza - são as que geralmente fazem menos sons."

Não sei se por conta da narrativa de Strickland ser tão envolvente e ele acabar roubando a cena quando aparece ou se era o fato de Elisa, a protagonista, ser muda e tímida, senti que a mesma ficou meio em segundo plano ao meu ver como leitora. Ela era uma mulher pequena, que exalava fragilidade mas que quando conhece o homem-anfíbio e se identifica com ele, uma criatura sem voz e quando o amor estranho entre os dois vai surgindo, ela descobre uma mulher forte em si que antes desconhecia. Os personagens principais da trama, se excluirmos o vilão e a criatura, são três pessoas que representam minorias, principalmente para a época em que a história se passa, nos anos 60: temos Elisa, uma mulher muda, orfã e com um passado triste, sua melhor amiga Zelda, uma mulher gorda e negra que cuida sozinha da casa porque seu marido não consegue ficar em um emprego por muito tempo e Giles, um homem já não tão jovem, gay e que está perdendo lugar no mercado de trabalho, já que era pintor de anúncios e naquela época, as fotografias estavam em alta.

"Uma menina disse: 'Ele faz com que eu me sinta alguém.' E Elisa ficou com isso na cabeça por meses. Qual seria a sensação de se sentir alguém? De repente, existir não apenas em seu mundo, mas no de outra pessoa também?"

É uma história que vai muito além de apenas um romance não-convencional. O livro aborda racismo, machismo, homofobia, o desespero dos americanos em conseguir uma arma efetiva contra os russos, o descaso do homem com a natureza por conta da ganância e muitos outros assuntos sérios. Tudo é abordado em alguns momentos de forma sutil e outros de forma mais óbvia. Simplesmente adorei como os personagens foram crescendo com o passar da história. A esposa de Strickland que ansiava por sua liberdade, cansada apenas de ficar em casa e exercer seu papel como "esposa", que é o que era esperado de uma mulher mãe e casada na época, Elisa que mesmo muda, descobriu uma voz e força para lutar por quem amava, a amizade entre ela, Giles e Zelda. Tudo isso me agradou demais.

"O que aconteceu com ela? Elisa acredita saber a resposta, apesar da ironia sombria: o que aconteceu com ela foi o amor."

Fica bem óbvio, conforme a leitura avança, que Strickland nutriu mais e mais por Elisa um desejo  sexual de dominância doentio. Ao seu ver, a figura muda e submissa de Elisa o excitava já que era um homem que sentia a necessidade de estar "por cima". Nesses momentos, senti muito incômodo, principalmente porque os capítulos que eram focados nele, eram bem pesados, mostrando a mente do personagem. Era uma narrativa que alguns teriam que fechar o livro por um momento para respirar fundo e absorver o que foi lido antes de continuar. Você não consegue sentir pena do personagem mas compreende o motivo de ele ser como é. Seus traumas de guerra, a pressão que sofre no trabalho, o desejo por sua liberdade do chefe opressor. Todo isso mexeu com sua mente e o transformou em quem era. Dá para entendemos que passou por coisas que o mudaram porém gostar dele já é demais. 

"Uma ausência de medo, percebe Elisa, pode ser confundida com felicidade, mas não é a mesma coisa. Nem de perto."

Mais uma vez digo que apesar do início parado, é uma obra maravilhosa e vale a pena insistir na leitura. Não achem que o livro é militante demais ou chato por abordar temas considerados polêmicos ou pesados porque não é. Uma leitura boa, um romance profundo, bizarro e diferente, bem a cara do Del Toro mesmo e com uma mensagem muito bonita por trás. 

A capa da Instrínseca é linda porém queria muito que fosse capa dura assim como o outro livro do Del Toro, O Labirinto do Fauno. Mas a edição é bem caprichada, com várias ilustrações bonitas no decorrer das páginas. É uma leitura mais do que indicada, bem intensa porém fluída e gostosa. Ouso dizer que me agradou mais do que O Labirinto do Fauno mas esse é o meu gosto pessoal. 

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